Bob Dylan, 72 anos

Certas vezes me pergunto: por que gosto tanto da música de Bob Dylan? As respostas devem estar soprando na droga do vento que assoviou cruelmente na minha janela às seis e meia da matina. Vento idiota (e frio) que me acordou nessa sexta-feira nebulosa e tingida de cinza aqui desse lado do planeta, em Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. 13° marca o termômetro. Um cara como eu poderia ser fã de Caetano Veloso, por exemplo, mas não. Me entendam: qualquer frase ou fragmento de uma letra do bardo norte-americano me dizem muito mais do que qualquer “gosto de te ver, leãozinho” de Caetano. Com Bob Dylan aprendi que a música não tem bandeira, e nesse terreno, sinto muito, cada dia que passa sou mais Dylanesco.

Dylan foi um dos inventores da música pop no formato que conhecemos hoje. Se os Beatles criaram o corpo elétrico do rock and roll, Dylan foi o homem que lhe deu um cérebro decente. O bardo foi pioneiro em muitas coisas. Em primeiro lugar inventou a si mesmo, para ao longo das décadas se reinventar dezenas de vezes. Ele foi primeiro a colocar uma música nas paradas com mais de três minutos (“Like a Rolling Stone”). O primeiro a lançar um álbum duplo, a mostrar uma foto desfocada na capa e a compor uma canção que tomasse conta de todo um lado do LP (tudo isso está em Blonde on Blonde, de 1966). Foi o primeiro a inventar o lado acústico de um álbum. Foi o primeiro a bolar um vídeoclipe e criou o rap antes de Gil Scott-Heron trocar os livros pela música (ouça “Subterranean Homesick Blues”, lançada em 1965).

Foi o primeiro ser pirateado e o primeiro a oficializar seus bootlegs. Foi o primeiro músico pop que se sujeitou a ser documentado num filme (Don’t Look Back). Foi o primeiro artista vinculado ao rock a desengessar a música country (Johnny Cash apostou suas fichas no amigo). Com a ajuda de David Geffen, foi o primeiro a esgotar os ingressos de uma turnê pelo correio, antes mesmo da internet sonhar em existir (em 1974, ao lado da The Band). Foi o primeiro a virar um box set (Biograph, lançado em 1985). Foi o primeiro músico a ser indicado ao Nobel de Literatura.

Não foi o primeiro em vender a alma, nem foi o último a encontrar Jesus num quarto de hotel, mas Dylan sempre foi uma espécie de profeta da música que passou por todos os tipos de provações, e apesar de crucificado várias vezes, sobreviveu para narrar suas histórias. Dylan não autorizou ninguém a contá-las - isso nunca! -, nada de apóstolos ou novos Messias, afinal, não existe um novo Dylan! O velho Robert Allen Zimmerman ainda está vivo e prestes a iniciar a segunda perna de sua turnê de 2013. Domingo ele toca na Flórida.


Longe de muitos dos seus colegas de profissão, nosso herói não vive à sombra do passado. Bob ainda consegue lançar álbuns de relevância e figurar nas listas dos melhores do ano - Tempest, seu último disco, lançado em setembro de 2012, ficou na quarta posição na lista da Rolling Stone.

Escritor, cineasta, poeta, radialista, artista plástico ... Sua vida ainda é um enigma, suas músicas ainda inspiram, seu mau humor é engraçada, sua obra continua pulsando, mesmo passados mais de 50 anos do pontapé inicial de uma carreira brilhante.

Salve Bob Dylan, 72 anos nesta sexta-feira, 24 de maio de 2013.

Vou colocar Nashville Skyline pra girar no toca-discos.

Por Márcio Grings

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