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Mostrando postagens de abril, 2023

Livro: Deep Purple 1968-1976, de Jerry Bloom (2023, Estética Torta)

O tempo passava mais devagar no passado. Essa percepção é comprovada tanto pela atual urgência onipresente, onde tudo é consumido – e vivido – na velocidade da luz, quanto ao nos darmos conta que os oito anos que transformaram o Deep Purple em uma das maiores bandas da história do rock é o mesmo tempo que o Metallica levou para lançar dois dos seus últimos discos: Death Magnetic saiu em 2008 e Hardwired ... To Self-Destruct em 2016. Deep Purple 1968-1976 cobre a primeira parte da carreira da banda inglesa e foi escrito por Jerry Bloom, jornalista e fã apaixonado do grupo. O livro tem 304 páginas, é dividido em sete capítulos e traz uma discografia detalhada da banda na parte final. A editora Estética Torta lançou Deep Purple 1968-1976 em duas edições: uma mais luxuosa em capa dura e outra mais simples, com capa brochura. Ambas possuem o mesmo conteúdo. O Deep Purple foi um fenômeno da natureza comandado por um músico genial, o guitarrista Ritchie Blackmore. Ao seu lado, dois outr...

Review: Fughetti Luz – Tempo Feiticeiro (2017)

Como convém a um país de dimensões continentais, o Brasil possui ídolos e lendas locais em cada uma de suas regiões. E na música não é diferente. Fughetti Luz, por exemplo, é uma das maiores lendas do rock gaúcho e praticamente desconhecido no resto do país. Vocalista e principal compositor de duas das bandas mais icônicas do rock brasileiro setentista, Liverpool e Bixo da Seda, seguiu carreira nas décadas posteriores e fez história também ao lado do Taranatiriça e da Badalieira, duas das formações mais cultuadas vindas do Rio Grande do Sul nos anos 1980 e 1990. Letrista de mão cheia e apaixonado pelo rock and roll, lançou também três álbuns solo. Fughetti Luz faleceu recentemente, aos 76 anos, no último 14 de abril. Seu legado é imenso para a história do rock gaúcho, com uma influência enorme na cena local. Muito disso é exemplificado através das quinze canções presentes em Tempo Feiticeiro , seu álbum derradeiro, lançado em 2017. Organizado e produzido por Marcelo Truda, guitarri...

Livro: Surrender – 40 Músicas, Uma História, de Bono (2022, Intrínseca)

A autobiografia de Bono é um livro sobre a fé. A fé em grandes nomes da história da música como David Bowie, Paul McCartney, Quincy Jones, Brian Eno, Luciano Pavarotti, Prince e muitos outros. A fé em personagens marcantes como Mikhail Gorbatchov, João Paulo II, Nelson Mandela, Steve Jobs, Bill Gates, Barack Obama e dezenas de outros. A fé religiosa que sempre guiou a vida de Bono e a carreira do U2. A fé nas pessoas, no mundo e na força da transformação. Publicada no final de 2022 de maneira simultânea em todo o mundo, Surrender: 40 Músicas, Uma História traz o vocalista do U2 contando a sua vida em 616 páginas, além de uma galeria de fotos. O livro é estruturado em quarenta capítulos, cada um deles batizado com o título de uma canção do U2. Como bem diz Bono em certo momento do livro, são as músicas conduzindo a sua história. Outra citação diz muito sobre o autor: “ Tenho uma memória muito boa, exceto pelas coisas que esqueci ”. A julgar pela quantidade de histórias contadas na ob...

Alguém ainda lê?

Alguém ainda lê resenhas de discos? Esse era o título original deste texto, mas daí me dei conta de que as pessoas não apenas não lêem mais reviews, como grande parte da população simplesmente não lê. Nada e nunca. Sobre as resenhas de discos, sei que sou obsoleto. Afinal, não apenas ainda leio as críticas dos títulos que me interessam, como também sigo escrevendo reviews. Foram eles que me despertaram o interesse pela crítica musical e são eles que me mantém incentivado a continuar produzindo conteúdo relacionado à música quando falamos de textos. Mas o alcance é pequeno, sei disso. Quase ninguém as lê, e isso é reflexo do tempo em que vivemos. Para muitos, a crítica musical perdeu totalmente a sua relevância na era das redes sociais, onde a opinião de um amigo vale muito mais do que o raciocínio de quem se debruçou sobre um álbum e procurou entender o que o artista quis dizer com o seu novo – ou velho e clássico – lançamento. Vale mais uma opinião curta do que a busca pelo signif...

Review: Blondshell – Blondshell (2023)

O Blondshell é a persona artística da norte-americana Sabrina Teitelbaum, e seu álbum de estreia é uma das belas surpresas de 2023. O temos aqui é rock alternativo em sua melhor forma com vocais marcantes, melodias cativantes e influências que vão de PJ Harvey a Hole, passando por Cranberries, Pixies e até mesmo Nirvana. As canções são diretas e variam entre três e quatro minutos, e o álbum em si tem pouco mais de 32 minutos. Quem sente saudades de Dolores O’Riordan irá adorar músicas como a ótima “Salad”, onde Sabrina canta de forma intensa sobre uma base pesada construída com guitarra, baixo, bateria e intervenções de teclado. “Veronica Mars”, que abre o disco, é um lamento e um grito de vingança contra um homem que maltratou uma amiga próxima. “Olympus” é sutil, com uma beleza calmante e uma letra que mostra o quanto a paixão intensa não é muito diferente de um vício. Já “Sober Together” vai direto ao ponto e trata do problema com drogas e em como a ajuda mútua pode tirar alguém d...

Review: Metallica – 72 Seasons (2023)

Mais do que qualquer um dos dez álbuns anteriores do Metallica, 72 Seasons exige que o ouvinte absorva, sinta e entenda o que James Hetfield está cantando. As letras são parte fundamental da força do disco e colocam as canções em outra dimensão. James nunca se despiu tanto e mostrou, sem filtro, seus medos, problemas e questões como aqui. O lado bom, o mau e o feio do líder do Metallica está escancarado, notadamente nos versos de canções como “Shadows Follow”, “Screaming Suicide”, “Chasing Light”, “If Darkeness Had a Son” e “Room of Mirrors”. Musicalmente, o que ouvimos equilibra a sonoridade apresentada em Harwired ... To Self-Destruct (2016) com mais elementos da NWOBHM e uma dose extra de agressividade e urgência. Saem as melodias e os ganchos fartos do último álbum, e em seu lugar surge a fúria e a violência, ingredientes que não apenas conversam, mas amplificam os temas abordados por Hetfield. 72 Seasons teve a produção assinada por James e Lars Ulrich com Greg Fidelman, o ...

Review: Miss Grit – Follow the Cyborg (2023)

Com influência de nomes como Björk, Grimes e St. Vincent, Miss Grit estreou em 2019 com o EP Talk Talk e chega agora ao seu primeiro álbum. De origem coreana, Margareth Sohn, a nome real da cantora, cresceu em Nova York e vive em Los Angeles. Sua música une batidas eletrônicas a guitarras pontuais, tudo embalado por letras introspectivas e emocionais. Essa é a abordagem de Follow the Cyborg . Com dez músicas e pouco mais de 35 minutos, o álbum equilibre momentos experimentais com canções mais acessíveis, alcançando um resultado excelente. A voz é o destaque, com o belo timbre de Grit construindo as melodias e entregando interpretações impecáveis. Isso fica claro já na primeira canção, a grandiosa “Perfect Blue”, e se mantém na hipnótica “Your Eyes Are Mine”. A excelente música que batiza o álbum une beats a um vocal etéreo, uma das características mais sólidas de Miss Grit, e evolui para linhas indiscutivelmente radiofônicas. Influências do rock, mais especificamente do pós-punk e ...

Discoteca Básica Bizz #213: Jeff Buckley - Grace (1994)

O padastro foi bacana: nos dois anos que viveu com a mãe dele, deu carinho e discos do Led Zeppelin que mudaram sua vida. O olhar triste nas fotos pode não ter nada a ver com isso, mas o fato é que Jeff Buckley foi um menino sem pai. Ou melhor, que teve pai por apenas cinco dias. Ao decolar para a fama, Tim Buckley o deixou para trás, na barriga da mãe. Quando o menino estava com 8 anos, a mãe, separada, o procurou. Foi então que pai e filho passaram juntos um feriadão de Páscoa. Um par de meses mais tarde, Tim cheirou mais heroína do que seu organismo podia processar e morreu, aos 28 anos. Deixou nove álbuns, a obra cantada com entusiasmo pela crítica, a voz de alcance admirável e surpreendentes fraseados jazzísticos, as canções lapidares entre o folk, o soul e a psicodelia, a poesia culta. Jeff morreu aos 30, num acidente triste, mas com tintas poéticas: afogou-se à noite no rio Wolf, em Memphis, pouco depois de cantarolar "Whole Lotta Love". Foi em 29 de maio de 1997. Até ...

Review: Host - IX (2023)

O Host conta com Nick Holmes e Greg Mackintosh, respectivamente vocalista e guitarrista do Paradise Lost. O projeto resgata a sonoridade de um dos mais controversos trabalhos da banda britânica, justamente o disco que batiza a iniciativa: Host , lançado em 1999. O que ouvimos em IX é um som sombrio, com os teclados assumindo o lugar dos riffs de guitarra, resultando em uma música que traz sabores e texturas da década de 1980 e 1990 e influências de nomes como Depeche Mode. Não há nada que remeta ao Paradise Lost e ao heavy metal, com Holmes e Mackintosh aprofundando uma abordagem que não seria possível em sua banda principal enquanto exploram influências muito bem-vindas e que podem chocar os mais ortodoxos. Muito bem feito, o trabalho traz nove faixas em quase 40 minutos e teve a produção assinada pelo próprio Greg. Os timbres são densos, o clima é soturno, Nick canta de forma mais suave e serena, utilizando tons graves que acentuam o clima gótico e coldwave do álbum. Entre as ...

Review: Crown Lands – Fearless (2023)

“Me diga com quem andas, que te direi quem és” : esse é um dos mais conhecidos ditados populares, e também pode ser aplicado à música. O exercício é bem simples: assim como o Greta Van Fleet é associado de forma direta com o Led Zeppelin, o Crown Lands faz o mesmo com o Rush. E ainda por cima são canadenses, olha só ... Fearless , segundo álbum do Cody Bowles (vocal e bateria) e Kevin Comeau (guitarra, baixo e teclado), bebe de forma direta e sem cerimônia na fase inicial do trio formado por Geddy Lee, Alex Lifeson e Neal Peart, mais especificamente nos álbuns Fly By Night (1975), 2112 (1976), A Farewell to Kings (1977) e Hemispheres (1978). O timbre vocal de Cody é muito semelhante ao de Lee, a guitarra de Kevin segue à risca a escola Lifeson, as viradas de bateria são no estilo Peart e a estrutura das canções não esconde a influência em nenhum momento. A sensação de estar ouvindo um novo álbum do Rush é constante durante a audição de Fearless , acentuando uma característica que...

Review: Glüme – Main Character (2023)

Esteticamente, a clara influência é Marylin Monroe. Musicalmente, as grandes inspirações vêm de David Bowie e Lana Del Rey. Essa é a sensação que Main Character , segundo álbum da vocalista, atriz, modelo e dançarina norte-americana Glüme, entrega ao ouvinte. E, devo dizer, é uma sensação cativante e bastante poderosa. Main Character é um trabalho pretensioso, que conta a história de uma estrela infantil e seu crescimento na indústria do cinema. A frase que abre a primeira música, “Child Actor”, pergunta: “Ator mirim, qual é o problema? / Disseram para você sorrir”. A faixa final, “Child Actor (Reprise)”, revela um destino não muito agradável para a personagem principal. As duas são ótimas, e entre elas não faltam momentos excelentes “Do Me a Favor” é um synthpop com fortíssimo apelo. “Brittany”, com participação de Sean Ono Lennon, tem uma introdução feita com uma sequência de notas que remete ao tema de Stranger Things , e então se desenvolve em uma composição sexy pra caramba,...

O review da Classic Rock para 72 Seasons, novo álbum do Metallica

Referência no jornalismo musical, a Classic Rock traz em sua nova edição o review de 72 Seasons , o aguardado novo álbum do Metallica. O texto foi escrito pelo jornalista Dave Everley e você pode lê-lo abaixo. O lançamento de um novo álbum do Metallica é um grande evento, o equivalente musical de um novo filme de Star Wars ou à chegada de um novo produto revolucionário da Apple. Com isso, vem a antecipação e a expectativa de uma base de fãs muitas vezes exigente, uma parte da qual parece perversamente saborear a possibilidade de ficar desapontada. O décimo primeiro álbum da banda não decepcionará ninguém, exceto o mais truculento fã do Metallica. 72 Seasons segue o roteiro elaborado em Death Magnetic , de 2008, e Hardwired ... To Self-Destruct , de 2016: metal moderno banhado a titânio, alimentado por uma intenção implacável de ser melhor, mais alto e mais nítido do que qualquer outro. Lançado no final de 2022, o primeiro single “Lux Aeterna” foi recebido como um filho há muito...

Review: Depeche Mode – Memento Mori (2023)

Reduzido a um duo após a morte de Andy Fletcher, o Depeche Mode foi resumido à dupla Dave Gahan (vocal) e Martin Gore (teclado e guitarra) em Memento Mori , seu décimo quinto álbum, lançado em 24 de março. Como era de se esperar não só pela perda imensa de Fletcher, fundador e figura central na música do grupo, mas pelo próprio histórico da banda, o que ouvimos é um álbum sombrio e denso. O apelo gótico melancólico dá o tom, sempre amparado pelos teclados característicos. A voz de Gahan varia entre em operístico e o forte timbre grave, enquanto Gore cria melodias e arranjos que tornam Memento Mori superior ao trabalho anterior, Spirit (2017). Os coros presentes em todo o disco, seja através da voz dobrada de Gahan ou pelas intervenções de Gore, funcionam como um eficaz elemento que imprime muito mais dramaticidade às canções. “My Cosmos is Mine” abre o álbum com a sobriedade e a densidade esperadas, enquanto “Wagging Tongue” mostra a majestade de uma banda que, desde que surgiu, s...

O review da Metal Hammer para 72 Seasons, novo álbum do Metallica

A Metal Hammer, mais importante revista especializada em heavy metal do planeta, ouviu o novo álbum do Metallica. Leia abaixo o review escrito pelo jornalista Stephen Hill após a audição de 72 Seasons , que será lançado no próximo dia 14 de abril. Vale a pena reservar um momento para se recompor antes de ouvir 72 Seasons , o novo álbum da maior banda de metal de todos os tempos, para que você não seja vítima de uma reação instintiva. Os fãs hardcore do Metallica há muito desejam ouvir um retorno ao fogo daqueles quatro primeiros discos consagrados e gritar sua empolgação a plenos pulmões. Em vez disso, sua decepção levou a algumas críticas injustas à banda, especialmente sobre os materiais lançados após St. Anger (2003). Sim, o Metallica teve sérias oscilações, como o ataque crítico de Lulu , de 2011. Eles também nos deram momentos de pura classe, como “Moth Into Flame” de Hardwired... To Self-Destruct , de 2016, que agora é digna de ser considerada um clássico da banda. Mas duran...

Review: Fever Ray – Radical Romantics (2023)

Radical Romantics é o novo álbum do Fever Ray, pseudônimo da sueca Karin Dreijer, que integrou o duo de música eletrônica The Knife ao lado irmão entre 1999 e 2014. Não muito prolífico – a estreia, batizada apenas como Fever Ray , foi lançada em 2009, e o segundo disco, Plunge , saiu em 2017 -, o som do Fever Ray merece a sua atenção. Talvez pela capa, o nome de Peter Gabriel me veio à mente quando ouvi Radical Romantics . E a referência ao ex-vocalista do Genesis se intensificou ao longo da audição da dez faixas do disco, não pela similaridade sonora, mas pelo desejo de inovação e o objetivo de sempre buscar novos caminhos. Essa abordagem é constante em Radical Romantics , o que torna o álbum interessantíssimo. A base do trabalho de Karin é a música eletrônica. Sintetizadores constroem as melodias e os arranjos, enquanto batidas que vão de influências mais dançantes até momentos mais tribais – ouça “New Utensils” – imprimem o ritmo. Os timbres, predominantemente graves, flertam s...

Review: Boygenius – The Record (2023)

Em um mundo que ainda trata pessoas LGBTQIA+ como um vírus incômodo e encara a sua simples existência como algo ofensivo – ou tão irresistível que os próprios críticos não conseguiriam controlar seus desejos ao estar frente a frente com uma pessoa homossexual ou trans, vai saber -, o surgimento do Boygenius é muito bem-vindo. O super grupo formado por Julien Baker, Phoebe Bridgers e Ludy Dacus nasceu de uma turnê conjunta que o trio realizou em 2016, com Dacus e Bridgers abrindo os shows de Baker. A aproximação revelou afinidades e acertos musicais, e a união foi a consequência. Julien, Phoebe e Lucy, três das artistas mais criativas surgidas nos últimos anos, se definem como gays ou bissexuais, e além da representatividade sempre necessária expressam nas letras questões relacionadas à forma como o rock trata, enxerga e se relaciona com artistas femininas. O próprio nome do projeto é uma resposta irônica às experiências negativas que as três tiveram com colaboradores masculinos. Além...

Review: Caroline Polachek - Desire, I Want to Turn Into You (2023)

Ao dar play em Desire, I Want to Turn Into You , segundo álbum da cantora norte-americana Caroline Polachek, a primeira referência que me veio à cabeça foi Kate Bush, muito pela exuberância vocal mostrada na música de abertura, “Welcome to My Island”. Figura aclamada nos bastidores da indústria – foi indicada ao Grammy pelo seu trabalho como produtora e engenheira de som do álbum autointulado lançado por Beyoncé em 2014, além de diversos outros trabalhos -, Polachek surgiu como vocalista do duo de synthpop Chairlift, com quem gravou três discos. Sua estreia solo aconteceu após o fim da banda, com o elogiado Pang (2019), e a ascensão continua com o novo trabalho – Polachek foi a atração de abertura de uma das etapas da turnê do álbum Future Nostalgia , de Dua Lipa. Produzido pela própria Caroline ao lado de outros produtores, o álbum traz doze faixas e apresenta um pop muito bem feito, com direito às participações especiais de Dido e Grimes em “Fly to You”. O trabalho de estúdio d...