Quando se fala em black metal norueguês, é impossível não mencionar o nome Satyricon. A banda, formada no início da década de 1990 por Satyr (Sigurd Wongraven) e Frost (Kjetil-Vidar Haraldstad), sempre se destacou por estar um passo à frente da ortodoxia do estilo. Seus primeiros álbuns – como Dark Medieval Times (1993) e Nemesis Divina (1996) – são clássicos incontestáveis do gênero, misturando a crueza do black metal com atmosferas melancólicas e, por vezes, épicas. Mas foi em Now, Diabolical, lançado em 2006, que o Satyricon deu sua guinada mais ousada.
Após o cultuado Volcano (2002), que rendeu prêmios e consolidou o Satyricon como uma das bandas mais respeitadas do metal extremo europeu, Satyr e Frost decidiram seguir um caminho ainda mais minimalista e cadenciado. Now, Diabolical surpreendeu fãs e críticos ao abandonar a velocidade e a ferocidade tradicional do black metal, optando por uma abordagem mais grooveada, seca e fria. A produção limpa, os riffs repetitivos e os vocais declamados revelaram uma banda disposta a chocar novamente — mas desta vez, dentro do próprio black metal. Ao invés de blast beats incessantes e paredes de som, Now, Diabolical aposta em ritmos lentos, refrões marcantes e uma atmosfera opressiva, com letras que mantêm o conteúdo anticristão e niilista, porém em um novo formato: mais direto e ameaçador.
“Now, Diabolical”, a faixa-título, abre o disco com um riff hipnótico e uma batida marcial. É um manifesto do novo estilo adotado pela banda — sombrio, elegante e ameaçador. “K.I.N.G.”, talvez o maior hit da carreira do Satyricon, é um hino que soa quase como um protesto contra o purismo do black metal, adornada por um refrão forte na medida para levantar o público nos shows. É uma faixa que uniu fãs de black metal e de outros estilos mais acessíveis. Já “The Pentagram Burns”, atmosférica e venenosa, é um dos momentos mais densos do disco. Os vocais de Satyr ganham uma tonalidade mais narrativa e hipnótica. A épica “To the Mountains”, com mais de oito minutos, encerra o álbum carregando ecos da era Nemesis Divina, mas filtrada pela nova abordagem: lenta, melancólica e grandiosa.
O álbum dividiu opiniões quando foi lançado. Muitos fãs da velha guarda acusaram o Satyricon de ter "traído" o black metal, enquanto outros celebraram a coragem de romper com os padrões e reinventar o gênero. A verdade é que o álbum consolidou uma nova fase para a banda e abriu caminho para discos ainda mais experimentais, como The Age of Nero (2008) e Satyricon (2013). Hoje, quase duas décadas após seu lançamento, Now, Diabolical é visto como um divisor de águas. É um dos primeiros álbuns de black metal norueguês a romper deliberadamente com o som tradicional dos anos 1990, sem perder a essência sombria que caracteriza o gênero. Sua influência pode ser sentida em bandas contemporâneas que misturam o black com o rock, o doom e o metal industrial.
Now, Diabolical é um álbum que desafiou convenções, irritou puristas e expandiu as fronteiras do black metal. Com sua produção limpa, composições focadas e clima sufocante, ele marca o momento em que o Satyricon deixou de ser apenas uma banda de black metal para se tornar uma entidade artística única, fiel apenas à sua própria visão.
Para quem quer entender como o black metal norueguês evoluiu e se transformou no século XXI, Now, Diabolical é uma audição obrigatória — e desconcertante.
Lançado no Brasil apenas na época, o disco estava fora de catálogo há quase vinte anos. A parceria entre a Warner, Wikimetal, Kanto do Artista e Oporto da Música trouxe o álbum novamente para os fãs brasileiros, em uma edição caprichada em CD com luva protetora e encarte de 12 páginas com as letras.
Comentários
Postar um comentário
Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.