O power metal já foi o rei das prateleiras, das lojas de CDs e dos cadernos de adolescentes que desenhavam logotipos no fundo da aula. Nos anos 1990 e 2000, o estilo era um dos motores do metal mundial — um ponto de entrada para novos fãs, um terreno fértil para melodias memoráveis e um abrigo para bandas que queriam unir peso, técnica e fantasia sem pedir desculpas. Duas décadas depois, parte do público trata o gênero com desprezo, reduzindo tudo a um estereótipo preguiçoso: o tal do “metal espadinha”. Uma rotulagem que tenta diminuir um movimento que, goste você ou não, ajudou a redefinir a cara do metal moderno.
O curioso é que o power metal sempre soube exatamente o que era: velocidade, melodias fortes, técnica acima da média, refrões gigantescos e uma espiritualidade própria — umas bandas mais heroicas, outras mais sombrias, todas apostando no escapismo como forma de expressão. Não é um estilo que tentou enganar ninguém. Ele nunca se vendeu como agressivo ao extremo, nem como experimental. O power metal sempre abraçou seu lado épico e melodramático. E isso, durante muito tempo, foi justamente sua maior força.
Clássicos não faltam. Keeper of the Seven Keys I e II, do Helloween, praticamente estabeleceram as bases do gênero. O Angra colocou o Brasil no mapa com Angels Cry, Holy Land e Rebirth, combinando velocidade com elementos brasileiros de forma única. O Blind Guardian expandiu limites narrativos em Imaginations from the Other Side e Nightfall in Middle-Earth, mostrando que o metal podia dialogar com literatura e criar universos próprios. O Stratovarius, nos anos 1990, moldou boa parte da sonoridade que seria copiada e reinterpretada por uma legião de bandas no início dos anos 2000. E o Rhapsody — antes de qualquer piada — criou um subgênero inteiro ao aplicar estética cinematográfica ao metal.
Todos esses discos foram porta de entrada para incontáveis fãs. Para muita gente, o power metal foi o primeiro contato com algo além do rock clássico. Era o passo seguinte, o momento em que o ouvinte descobria que o metal podia ser mais rápido, mais técnico, mais grandioso. O estilo cumpriu a função que antes pertencia ao Iron Maiden e ao Scorpions: mostrar que existe um mundo maior esperando pela curiosidade do iniciante. Não é coincidência que músicos de várias vertentes — do prog ao extremo — mencionem discos de power metal como influências de formação.
O desprezo atual diz menos sobre o power metal e mais sobre a própria cena. Parte do público parece ter criado medo de demonstrar entusiasmo. Tudo que é emotivo demais vira piada. Tudo que é melódico demais vira fraqueza. Tudo que foge da cartilha da “credibilidade” é automaticamente rebaixado. É uma estética da ironia, onde admitir que você gosta de algo grandioso ou melodramático virou pecado.
Só que o power metal não precisa da aprovação dos cínicos. O estilo continua vivo porque sempre existiu para quem gosta de sentir a música de forma direta, honesta e sem camadas de ironia protegendo o artista do próprio entusiasmo. Continua inspirando jovens músicos. Continua recebendo festivais dedicados. Continua sendo a trilha sonora de quem não tem vergonha de se emocionar com refrões gigantescos.
Chamar o power metal de “metal espadinha” é fácil. Difícil é olhar para trás e negar a importância do gênero na formação de uma geração inteira de fãs e músicos. O que muita gente hoje despreza foi, e ainda é, um dos pilares do metal moderno.
E quer saber? Toda cena que deixa de abraçar suas melodias e sua capacidade de sonhar fica um pouco menor. O power metal pode estar fora do hype, mas nunca perdeu sua relevância. E quem tenta rebaixá-lo talvez esteja apenas tentando esconder que, lá no fundo, sabe cantar aqueles refrões de cor.



Mas será que isso não é mais no Brasil devido à ação dos críticos musicais brasileiros que são muito avessos a esse subgênero? Se reflete também no resto do mundo? Nos EUA sei que esse gênero nunca foi muito popular....acho que é um tipo de metal mais europeu...tem aquela série de documentários sobre os gêneros de metal que até comenta isso...esqueci o nome dela...
ResponderExcluirSim, mas o texto retrata a cena brasileira, não a americana e nem a mundial.
ExcluirAhh sim...então faz todo sentido. Não tinha ficado claro para mim lendo o texto.
ExcluirRapaz, acho que isso reflete na verdade um mal mundial que é o fato de que o senso crítico sem bom senso se tornou um senso comum. Antes da Internet, não tinha tanta facilidade assim pras pessoas comuns publicarem opinião. Atualmente todo mundo opina sobre tudo e se tornou"sinônimo"de sensatez você ser crítico (o que é uma má compreensão da crítica até). E mais recentemente, as influências ganharam peso (influencers) e suas opiniões acabam sendo imitadas, definindo moda, etc. Enfim, no fundo pouco importa porque música envolve outros valores, inclusive valores não racionais. Quem vê ou trata música como objeto absolutamente racionalizado tá ignorando a experiência, motivações, sentido, história, até propósito, enfim, tantas camadas e escolhendo a ignorância. Igual alguém tentar explicar a experiência de dirigir um automóvel racionalmente. Vc vai estar ignorando a experiência e a habilidade corporal exigida para dirigir um, na falta de um exemplo melhor. kkk
ResponderExcluirPowermetal continua sendo música, continua sendo bom pra quem gosta, como eu, continua acompanhando nossos momentos e sendo também uma experiência privada, íntima.