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O Retorno do Chacal – Sádica Vingança: faroeste bruto e o resgate de um Brasil das bancas (2025, Tábula Editora)


A Tábula Editora segue, volume após volume, reconstruindo um pedaço importante e meio esquecido da memória dos quadrinhos brasileiros. O Retorno do Chacal – Sádica Vingança é mais um capítulo desse esforço. Publicado originalmente em Novo Chacal nº 22, de 1982, a história retorna agora com restauração cuidadosa, tratamento editorial digno e o charme imbatível de um faroeste que nunca tentou ser outra coisa além de direto, brutal e deliciosamente popular.

O personagem Tony Carson, o Chacal, vive daquilo que sempre moveu os anti-heróis mais interessantes: sobrevivência, pragmatismo e um código moral que não cabe em nenhuma lei oficial. O roteiro de Antônio Ribeiro abraça tudo isso sem cerimônia. A trama tem o ritmo seco das histórias de banca da época: ação rápida, violência sem floreios e a sensação de que, naquele Oeste hostil, ninguém está totalmente a salvo, muito menos emocionalmente intacto.

O grande chamariz, como em toda a obra do personagem, está no desenho de Jordí, que possui um domínio instintivo do preto e branco, algo entre o expressionismo vigoroso e a economia estética que os quadrinistas do faroeste italiano e argentino dominavam tão bem. Os enquadramentos são eficientes, as cenas de confronto têm peso, e o uso das sombras traz uma dramaticidade que a edição restaurada da Tábula faz questão de preservar.


O volume tem formato 17x25, 88 páginas e impressão em papel couchê, com textos extras e uma entrevista com Jordí. Fica claro o respeito ao material original sem abrir mão de torná-lo acessível ao leitor atual. Não é apenas uma republicação, mas uma espécie de arqueologia apaixonada. Você sente que alguém cuidou do que tinha em mãos, e isso faz diferença.

Sádica Vingança não é uma obra-prima esquecida, tampouco tenta competir com os clássicos italianos do gênero. Seu valor é outro: é um documento vivo de uma fase da nossa indústria, da nossa produção e da nossa cultura de banca. É pulp brasileiro, feito sem medo de ser pulp, pensado para entreter, vender e continuar no mês seguinte. E, justamente por isso, é delicioso de revisitar.

Para quem acompanha a coleção (que deve ter um total de 11 números), este volume reforça a qualidade do projeto. Para quem nunca leu Chacal, talvez seja a porta de entrada perfeita: violenta, crua e rápida, mas com identidade própria. É o tipo de material que ajuda a montar o quebra-cabeça da formação de gerações de leitores e artistas no país. A Tábula faz aqui o que poucas editoras têm coragem de fazer: devolver ao presente obras que poderiam ter desaparecido no tempo. E faz isso com carinho, método e muita consciência histórica.

Um pequeno pedaço de quem fomos, e de como os quadrinhos brasileiros podem (e merecem) ser tratados.


Comentários

  1. Embora leia quadrinhos desde 1966, não cheguei a comprar o personagem nas bancas, até por excesso de ofertas de gibis dos mais variados temas à época. Mas estou dizendo agora esta coleção da Tabula e gostando bastante.

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